O texto a seguir foi publicado na página eletrônica do jornal "Diário do Aço" e está disponível no link: http://www.diariodoaco.com.br/colunas.aspx?cd=2007
FUNCIONÁRIA GANHA AÇÃO DE R$5 MIL
“Quer pagar quanto? Olhou, levou!”. Da forma como foram utilizados, são proibitivos esses enunciados publicitários, segundo o desembargador Marcelo Antero de Carvalho. O magistrado condenou a rede varejista Casas Bahia a pagar R$5.000, por danos morais, a uma funcionária por tê-la obrigado a usar broches com tais falas. O relator do processo foi categórico: “A obrigatoriedade do uso de broches com dizeres que dão margens a comentários desrespeitosos por parte de clientes e terceiros configura violação do patrimônio imaterial do empregado” (FSP, Mercado, 26/11/2011).
LEILÃO HUMANO
A considerar preceitos éticos que orientam a elaboração de campanhas publicitárias, esses polêmicos enunciados não teriam sido cunhados propositalmente para vender pessoas, e sim coisas. Mesas, sofás, eletrodomésticos, por exemplo. Por que, então, esses textos acabaram se configurando numa espécie de “leilão humano”, tanto no entendimento da funcionária demitida quanto na visão do desembargador? Muitos fatores contribuíram para a ocorrência desses conflitos. Podemos considerar, por exemplo, que não há simetria na comunicação. Por essa razão, alguns clientes das casas Bahia, colocando-se como sujeitos interpretantes, atribuíram aos enunciados propagandísticos valores possivelmente não pensados pelos organizadores da campanha publicitária, se considerarmos as normas e regulações a que se submetem as Agências de Publicidade. Por outro lado, não teria sido uma estratégia propositalmente conflituosa? Abaixo a ética! Vamos polemizar! Os ganhos compensarão as perdas!
SUPORTE TEXTUAL
Também, convém ressaltar que o tipo de suporte textual em que os enunciados foram fixados (corpo da funcionária) é algo, realmente, inusitado. Embora muitos utilizem o corpo humano para fazer tatuagens com mensagens variadas, ele não é um suporte convencional para textos diversos, tal como uma revista, um jornal, um livro. Suporte textual tem a ver com a “ideia de um portador do texto, mas não no sentido de um meio de transporte ou veículo, nem como um suporte estático”, e sim como um “locus físico ou virtual com formato específico que serve de base ou de ambiente de fixação do gênero materializado como texto”, como nos lembra o linguista Luiz Antônio Marcuschi, da UFPE. O suporte, então, não é neutro, pois tem algum tipo de repercussão sobre o gênero que suporta, podendo, inclusive, sobredeterminar o gênero do discurso. Assim, uma campanha publicitária, tal como a das Casas Bahia, exigiria outros tipos de suporte, como um outdoor, um jornal, a internet, por exemplo.
GÊNEROS DO DISCURSO
Mas, o que seria um gênero do discurso nessa mesma visão de Marcuschi? Os gêneros são textos que encontramos em nosso cotidiano, alguns mais estáveis, outros menos, porém todos apresentam “padrões sociocomunicativos característicos definidos por sua composição, objetivos enunciativos e estilo concretamente realizados”, características afetadas pelo tipo de suporte utilizado nessa campanha publicitária. Podemos, ainda, constatar que os conflituosos textos das Casas Bahia têm uma natureza essencialmente linguística. Por essa razão, definem-se também pela característica da tipologia textual de que são constituídos.
TIPOLOGIAS TEXTUAIS
Cada tipologia apresenta alguma particularidade. A considerar esse critério, os tipos textuais podem ser de ordem narrativa, dissertativa, argumentativa, descritiva, injuntiva, dialogal. Em “Olhou, levou!”, estamos diante de uma tipologia injuntiva, isto é, de uma forma de organização textual em que se sugere um comportamento, uma ação, nesse caso especificamente, condicionada a uma outra ação: Se olhar, vai levar. Já o enunciado “Quer pagar quanto?” tem uma natureza dialogal. Nele, propõe-se uma conversação com um suposto interlocutor, por meio de linguagem informal. As duas tipologias textuais (injuntiva / dialogal), no caso dessa campanha publicitária, também contribuíram para produzir o indesejado sentido, pois conduzem à interação, pedem respostas, sugerem comportamentos. O problema é que o objeto envolvido nas ações propostas (olhe, leve)) foi a própria funcionária que serviu de suporte ao gênero suportado.
“Quer pagar quanto? Olhou, levou!”. Da forma como foram utilizados, são proibitivos esses enunciados publicitários, segundo o desembargador Marcelo Antero de Carvalho. O magistrado condenou a rede varejista Casas Bahia a pagar R$5.000, por danos morais, a uma funcionária por tê-la obrigado a usar broches com tais falas. O relator do processo foi categórico: “A obrigatoriedade do uso de broches com dizeres que dão margens a comentários desrespeitosos por parte de clientes e terceiros configura violação do patrimônio imaterial do empregado” (FSP, Mercado, 26/11/2011).
LEILÃO HUMANO
A considerar preceitos éticos que orientam a elaboração de campanhas publicitárias, esses polêmicos enunciados não teriam sido cunhados propositalmente para vender pessoas, e sim coisas. Mesas, sofás, eletrodomésticos, por exemplo. Por que, então, esses textos acabaram se configurando numa espécie de “leilão humano”, tanto no entendimento da funcionária demitida quanto na visão do desembargador? Muitos fatores contribuíram para a ocorrência desses conflitos. Podemos considerar, por exemplo, que não há simetria na comunicação. Por essa razão, alguns clientes das casas Bahia, colocando-se como sujeitos interpretantes, atribuíram aos enunciados propagandísticos valores possivelmente não pensados pelos organizadores da campanha publicitária, se considerarmos as normas e regulações a que se submetem as Agências de Publicidade. Por outro lado, não teria sido uma estratégia propositalmente conflituosa? Abaixo a ética! Vamos polemizar! Os ganhos compensarão as perdas!
SUPORTE TEXTUAL
Também, convém ressaltar que o tipo de suporte textual em que os enunciados foram fixados (corpo da funcionária) é algo, realmente, inusitado. Embora muitos utilizem o corpo humano para fazer tatuagens com mensagens variadas, ele não é um suporte convencional para textos diversos, tal como uma revista, um jornal, um livro. Suporte textual tem a ver com a “ideia de um portador do texto, mas não no sentido de um meio de transporte ou veículo, nem como um suporte estático”, e sim como um “locus físico ou virtual com formato específico que serve de base ou de ambiente de fixação do gênero materializado como texto”, como nos lembra o linguista Luiz Antônio Marcuschi, da UFPE. O suporte, então, não é neutro, pois tem algum tipo de repercussão sobre o gênero que suporta, podendo, inclusive, sobredeterminar o gênero do discurso. Assim, uma campanha publicitária, tal como a das Casas Bahia, exigiria outros tipos de suporte, como um outdoor, um jornal, a internet, por exemplo.
GÊNEROS DO DISCURSO
Mas, o que seria um gênero do discurso nessa mesma visão de Marcuschi? Os gêneros são textos que encontramos em nosso cotidiano, alguns mais estáveis, outros menos, porém todos apresentam “padrões sociocomunicativos característicos definidos por sua composição, objetivos enunciativos e estilo concretamente realizados”, características afetadas pelo tipo de suporte utilizado nessa campanha publicitária. Podemos, ainda, constatar que os conflituosos textos das Casas Bahia têm uma natureza essencialmente linguística. Por essa razão, definem-se também pela característica da tipologia textual de que são constituídos.
TIPOLOGIAS TEXTUAIS
Cada tipologia apresenta alguma particularidade. A considerar esse critério, os tipos textuais podem ser de ordem narrativa, dissertativa, argumentativa, descritiva, injuntiva, dialogal. Em “Olhou, levou!”, estamos diante de uma tipologia injuntiva, isto é, de uma forma de organização textual em que se sugere um comportamento, uma ação, nesse caso especificamente, condicionada a uma outra ação: Se olhar, vai levar. Já o enunciado “Quer pagar quanto?” tem uma natureza dialogal. Nele, propõe-se uma conversação com um suposto interlocutor, por meio de linguagem informal. As duas tipologias textuais (injuntiva / dialogal), no caso dessa campanha publicitária, também contribuíram para produzir o indesejado sentido, pois conduzem à interação, pedem respostas, sugerem comportamentos. O problema é que o objeto envolvido nas ações propostas (olhe, leve)) foi a própria funcionária que serviu de suporte ao gênero suportado.
Glória Dias Soares Vitorino. Doutora em Língua Portuguesa e Linguística. Mestre em Leitura e Produção de Textos. Especialista em Língua Portuguesa. É membro da Associação Latino-americana de Estudos do Discurso (ALED). É professora de Língua Portuguesa e Linguística no Ensino Superior. gloriavitorino@hotmail.com
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